terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Dark Pages - Ana, Parte I




Após todas as reuniões de pais Ana ficava esgotada mental e fisicamente. Todos os semestres eram as mesmas histórias, as mesmas desculpas imbecis que os pais inventavam tentando despertar algum sentimento, com medo de que o professor reprovasse um monte de crianças que não fariam diferença alguma na sociedade.

Como depois de todas as reuniões de pais, Ana organizou as cadeiras e colocou de volta ao mural as pinturas das crianças, finalmente aquela tarde insuportável tinha acabado e ela poderia voltar para casa e para sua garrafa de vinho barato. Depois de pendurar cinco versões diferentes de Monalisa na parede, voltou à sua mesa para pegar o casaco.

– Com licença – Ana se virou e encontrou uma mulher espantosamente magra e pálida na porta da classe. – Eu conversei com a coordenadora e ela me falou que eu poderia chegar depois do horário para falar sobre meu filho...

– Bom, a reunião já acabou e os outros pais já foram. Você apenas perdeu uma dinâmica sem importância – Ana reuniu forças para parecer o mais amigável possível, considerou-se uma diplomata por acrescentar um sorriso. – Me desculpe, mas quem é o seu filho?

– Está tudo bem, ele ainda não estuda nesta escola – a mulher deu um longo suspiro. – Ele tem alguns problemas em fazer novos amigos e a diretora achou que você poderia me tranquilizar – a mulher segurava firmemente a alça da bolsa de couro. Ela parecia ter dinheiro, tinha que ter para matricular um filho naquela escola. – Eu me chamo Elisabete, meu filho se chama Pedro e tem nove anos.

– Bom – Ana acrescentou com um sorriso. – Acho que ele irá se sentir bem enturmado, temos apenas doze alunos nessa sala e todos são da mesma idade de Pedro. São sete meninos, é um grupo muito bom de trabalhar, são crianças muito comunicativas e amigáveis – Mentira! Esses pestinhas comeriam seu filho vivo se pudessem – Ana pensou enquanto sorria para a mãe. – E ainda temos mais duas semanas de aula antes das férias, ele vai ter tempo o suficiente para se adaptar. O que a senhora acha? Pode esperar até o semestre que vem, mas essas duas semanas e depois as férias dariam a ele mais tempo para se acostumar com os novos amiguinhos – os pais não sabiam, mas os professores recebiam um adicional por cada pai que conseguiam convencer a fazer a matrícula.

– Será que isso vai ser possível?

–Com certeza! Ainda estamos na quinta-feira, você pode fazer a pré-matrícula dele hoje, trazer os documentos amanhã e já na segunda-feira teremos mais uma pintura no quadro – para enfatizar, Ana apontou para um espaço vazio entre duas pinturas de alunos. – Tenho certeza que você vai gostar de ter um desses em seu escritório daqui a uns dias.

Trinta minutos depois Ana já estava tranquilamente fumando em seu carro. Aquela já era a terceira criança somente nesse bimestre, se continuasse assim exigiria uma comissão maior, pensou.

A expectativa das férias contagiava a todos, desde professores e outros funcionários da escola até os alunos. Quanto mais o tempo passava, mais os professores ficavam desesperados por não terem cumprido o calendário e terem acumulado tarefas ao longo do semestre e mais os alunos resmungavam das notas.

Em meio a tanta anarquia, mal se notou o novo aluno na turma de Ana. Ele parecia ter fugido de algum comercial de margarina, era loiro e tinha as bochechas bem rosadas; sua pele era clara, mas não pálida, e ele tinha lindos dentes brancos que não fazia questão de esconder sorrindo para todos a sua volta. O garoto apenas fora notado ao final da aula, quando Ana fizera a chamada e os alunos se assustaram com mais um nome na lista.

Pedro era um menino discreto, falava baixo, era simpático, mas não sentara com nenhum dos coleguinhas no intervalo, chamava a atenção por sua beleza, mas era muito novo para saber usá-la com os outros.

A terça-feira chegou antes que Ana pudesse notar e trouxe consigo as aulas de Educação Física, que significavam duas horas de folga para os professores. Ana tomava um café na cantina quando começaram os gritos, que foram se tornando cada vez mais nítidos até que estava encarando o professor de ginástica com um dos meninos em seus braços.

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