terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Dark Pages - Ana, Parte IV


Imagem: Giovanni Zanelato


–Não sei como a Júlia estava suja de tinta! – foi com uma mistura de espanto e desconfiança que Beatrice concluiu seu pensamento enquanto conversava com Ana na sala dos professores durante o intervalo.

–Meninas, o recreio acabou – a diretora interrompeu com cara de poucos amigos.

Ao chegar à classe, Ana encontrou em sua mesa um envelope. Pedro, o aluno novo, estava entregando para todos os alunos convites para sua festa de aniversário.

– Amanhã? – Ana olhava espantada para o convite – Mas amanhã é terça-feira!

– Sim, amanhã! – Predo respondeu de pronto.

Ana achou muito estranho uma festa bem no começo da semana, mas nem pode contestar, novamente seus ouvidos estavam zunindo. Mal conseguia ouvir o que as crianças falavam. Para sua sorte, mais duas horas de aula e ela estaria livre para ir para casa e se entupir de analgésicos. Dessa vez o apito que ouvia estava tão forte que sentia saudades do relaxante muscular.

Final de aula, hora de ir para casa, Ana estava ligando para um taxista quando Pedro apareceu.

– Meu pai está esperando, vamos! – ela nem resistiu estava esgotada mentalmente, sua cabeça estava latejando. Então apenas segurou a mãozinha do garoto e se deixou guiar até o carro.

Menos de vinte minutos depois estava em seu apartamento. Em menos de vinte minutos sua dor de cabeça se intensificou a ponto de não saber como conseguiu informar a Thomas o seu endereço. E, em menos de vinte minutos, a única coisa que lembrava era que o nome do pai de Pedro era Thomas. Não se lembrava de ter entrado no carro, ter guardado seu casaco na bolsa ou de ter aberto o apartamento.

Depois de um banho quente, deitou na cama e apenas dormiu.

Depois de horas aguentando as crianças comentando sobre a festa, horas percorrendo o shopping atrás de um presente e após alguns minutos aguentando um taxista com um forte sotaque contando sobre os problemas do filho caçula, Ana estava finalmente em frente aos grandes portões de ferro da casa de Pedro.

Já eram quase oito horas da noite e muitos metros após o portão via algumas crianças subindo as escadas da casa. Apertou o interfone e aguardou.

–Pois não? – uma voz mal humorada respondeu. – Quem deseja?

–Sou eu – Ana se sentiu um pouco idiota com a resposta curta e completou. – Sou professora de Pedro, estou aqui para a festa de aniversário – ela ouviu um rangido metálico, uma câmera de segurança a estava encarando. Tentou parecer menos tensa sorrindo para a lente.

– Oh! – e um som agudo anunciou que os portões da casa estavam se abrindo. Ana ouvia o ranger do suporte da câmera de segurança acompanhar seus passos. – Aí mesmo, está perfeito. Aguarde que irão busca-la.

Logo Ana viu o carrinho de golf descendo pelos jardins. A antes mal humorada voz era de um jovem rapaz, que provavelmente acabara de sair do ensino médio e que aguardou com ela enquanto outro empregado descia com o carrinho.

O motorista daquele veículo, que parecia ser de brinquedo, era um senhor muito sorridente, ainda que de poucas palavras, contou apenas que havia muitas mães na festa, mas que nenhuma estava usando tênis e jeans como ela.

Até podia formar em sua mente imagens de mulheres artisticamente maquiadas e com longos vestidos de tecidos que um salário de professor jamais iria pagar.

Sem nenhuma decepção ao ver que ela aparentava ser mais juvenil que as crianças na festa. O salão ficava atrás da casa, o velhinho fora gentil e deixara Ana na entrada do salão, enquanto que os outros convidados tinham que caminhar pela varanda lateral até dar a volta completa na casa.

Sem muito ânimo ao ver que provavelmente seu presente seria o mais humilde da festa, ela simplesmente deixou a caixa na mesa de presentes e perseguiu um dos garçons até conseguir uma taça de espumante.

Enquanto bebia, sentia os olhares das mães peruas. Deviam estar comentando sobre seu cabelo, suas roupas, a ausência de joias... Até as meninas de nove anos estavam vestidas como prostitutas de luxo e Ana poderia apostar que vira uma garotinha com seios de silicone!

–Senhoras mães e pais – Thomas, pai de Pedro, estava com um microfone no fundo do salão, onde havia uma linda escada de mármore. Agradeço a presença de todos aqui hoje, sei como é difícil deixar seus compromissos... – e assim ele continuou seus agradecimentos.

Ana não conseguia prestar atenção, não havia muitos pais, na verdade a grande maioria eram mães.

Após alguns instantes, as mulheres começaram a sair pela porta lateral, Ana estava seguindo quando sentiu que alguém a puxava pelo braço. Era o pai de um dos garotos que já abusara do whisky. Quando ela finalmente conseguiu se desvencilhar do bêbado, uma dezena de empregadas uniformizadas entrou no salão e guiaram os homens, até uma sala menor, Ana apenas ficou sozinha no meio do salão vazio.

Quando finalmente percebeu que era a única, rumou para onde as empregadas guiaram os visitantes. Lá dentro as antes comportadas empregadas tiravam a roupa. Havia poucos homens, mas pelo menos o dobro de mulheres dançando. Próximo à porta, Ana pôde ver o pai bêbado, que antes a estava importunando, beijando os seios de uma das empregadas.

– Mas que porra... – ela foi puxada pelos cabelos antes que pudesse completar a frase. Olhou para cima e percebeu que, apesar da aparência frágil, a mãe de Pedro era consideravelmente forte. Ana se debateu por alguns metros até que foi colocada em pé.

Elisabete abriu a porta de um enorme corredor com espelhos e bancadas com maquiagem e máscaras. As mães estavam se arrumando e foram surpreendidas pelos gritos da professora.

Ana apenas conseguiu se livrar quando Elisabete acionou um botão ao lado da porta. Rapidamente empurrou a mulher para dentro do corredor, bem a tempo de duas enormes lâminas de metal se unirem, degolando as mães que estavam sentadas se maquiando. A cena parecia um elevador preso entre dois andares, mas com cabeças, mãos e bustos sangrentos.

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