terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Dark Pages - Ana, Parte III

Imagem: Giovanni Zanelato


Após o horário de saída dos alunos, a diretora reuniu os professores e informou que a escola seria vistoriada naquela noite, um dos pais levantou a teoria de que poderia ser um vazamento de gás. Ana achou aquilo ridículo, ambos acidentes aconteceram em áreas bem ventiladas e nenhum outro aluno passou mal.
Depois da reunião, Ana voltou à sala para pegar seu casaco. A maioria das crianças nem terminara a pintura. E dessa vez os pais ficariam orgulhosos, as crianças estavam caprichando, o girassol de Pedro parecia ter sido feito por um profissional.
Na sexta feira, fora quase impossível conter as crianças, alguns estavam usando máscaras cirúrgicas a pedido dos pais. Ana esboçou um sorriso irônico ao pensar que a maioria das mães preferia mandar o filho para a escola, mesmo que usando mascaras, a perder um passeio no shopping ou uma ida ao esteticista.
Ana apenas se sentia grata por a menina que caíra da escada não ser uma de suas alunas. Seria muito mais difícil controlar as crianças e os pais, já que mesmo com os dois acidentes e a estúpida teoria de vazamento de gás a diretora insistia em não interromper as aulas.
Naquela noite que antecedeu o final de semana, Ana acordara com o ouvido zunindo novamente. Provavelmente seria algum reflexo de stress, ou muito café. Resolveu tomar uma grande caneca de chocolate quente, ajudaria a dormir.
Já com a caneca em mãos e uma tigela com biscoitos, entrou no quarto. Com as luzes acesas pode ver que seu travesseiro estava sujo. Jogou o travesseiro de lado, sentou-se e ligou a TV. Tentou se concentrar em um filme estúpido de comédia, mas fora impossível. Seu cérebro apenas se concentrava no zunido incessante.
Desta vez o zunido não parou, Ana foi até o pronto socorro onde os médicos suspeitaram de tudo, fizeram uma limpeza nos ouvidos, lhe deram calmantes, até mesmo um relaxante muscular que a fez babar como um São Bernardo velho. Mas o zunido prosseguia, e o final de semana já estava no fim.
Ana fora proibida de dirigir por causa do seu estado de nervos, mas ainda assim não fora dispensada de seu trabalho. Evitando encontrar mais pessoas que o necessário naquele dia, Ana resolveu usar um táxi ao invés do transporte público.
O taxista resolvera tomar o caminho do centro, e, como Ana avisara, estavam presos em um engarrafamento. Ao lado estava um carro com os vidros muito escuros, que ela reconheceu como o carro dos pais de Pedro.
Ana pagou o taxista e resolveu ir á pé para o trabalho, atravessou os carros parados e seguiu pela calçada. Provavelmente chegaria vinte minutos atrasada, mas ainda assim, era melhor que esperar naquele transito infernal.
Faltavam menos de três quarteirões para chegar à escola e o carro com as janelas escuras parou ao seu lado, Pedro abriu a porta sorridente oferecendo carona. Ana aceitou e sentou-se ao lado do menino, que recuara no banco para lhe dar espaço.
– Obrigada pela carona – Ana olhou para o motorista, não podia ver seu rosto, mas a nuca masculina era coberta por cabelos loiros. – Eu não gosto muito de caminhar.
– Tudo bem, vimos a senhora saindo do taxi no engarrafamento. Seu carro está quebrado? – o menino a encarou. O carro estava andando.
– Não, eu apenas recebi um conselho do meu médico... – Ana percebeu naquele momento que seu ouvido não estava mais zunindo. Há quanto tempo aquilo parou?
– Você me parece bem, tenho certeza de que logo será liberada para dirigir – o motorista se virou, era uma versão adulta de Pedro. – Enquanto isso pegue quantas caronas quiser conosco.
As portas foram destravadas, estavam em frente à escola e o garotinho já havia descido do carro. Ana agradeceu ao homem e acompanhou o menino para dentro da escola.
Durante o intervalo, Ana estava na sala dos professores tomando um café quando entrou a diretora conversando com outra professora, Beatrice.
Pobre Beatrice, Ana pensou, a aluna que caíra das escadas era de sua turma.
– Oi, Ana, você que socorreu a Júlia, certo? – Beatrice estava com os olhos cheios de lágrimas.
– Eu não sabia que ela se chamava Júlia, sim eu a encontrei caída no final da escada. Ela está bem? – Ana foi até a cafeteira, encheu um copo e entregou à colega.
– Eu acho que sim, a mãe apenas reclamou que sujamos o uniforme de tinta.
–Nós também estávamos na aula de pintura.
–Aula de Pintura? – Beatrice ficou confusa – Não, estávamos na aula de matemática.

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